domingo, 7 de dezembro de 2008

A renovação do interesse na Tradição - parte II

Parte II (Parte I)

Na mesma altura em que o emergente metafísico Francês se voltava para os círculos ocultistas Parisienses, um graduado do University College de Londres encontrava-se no Ceilão como geólogo dirigindo a Mineralogical Survey, o que lhe valeria o Doutorado da Universidade de Londres em 1906, com a idade de vinte e nove anos. Assim começou a carreira de Ananda K. Coomaraswamy (1877-1947), nascido em Colombo e filho de um ilustre Shaivita Hindu de Tamil e de um Inglesa patrícia que criou o seu único filho em Inglaterra após a prematura morte do seu marido.

Na mesma altura em que descobria, em 1904, um raro óxido que apelidou de torianita, o jovem Coomaraswamy estava a encontrar um tesouro negligenciado de uma tal magnitude que se sentiu impelido a iniciar uma nova carreira: este tesouro era a magnífica herança cultural Indiana com mais de três mil anos, uma herança intimamente ligada à do Ceilão, e cujas fundações eram agora erodidas por aquilo que Guénon apelidava de “fúria proselítica” do Ocidente e, em particular, com as suas artes a sucumbir perante a vaga de produtos industriais vindos da Europa. O que mais provocou Coomaraswamy foi a apatia Asiática perante a transição que estava a ocorrer; ele deplorava a “falta de auto-respeito e auto-dependência entre as pessoas que tinham aprendido a olhar para trás em desprezo do seu passado e a admirar, indiscriminadamente, todos os modos estrangeiros que viam ter hipótese de imitar… É inútil, é claro, falar daqueles que consideravam todo o passado das nações do Oriente, anterior ao advento da civilização Ocidental, como meramente bárbaro e selvagem; existem muitos assim, e eles lembram-me muito os homens do século dezasseis que voltaram, com desdém, as costas ao passado Inglês e à beleza Inglesa para fazerem um cópia degenerada da literatura e arte clássica.”

O jovem Doutor tentou, em primeiro lugar, agir na reforma social, mas rapidamente se apercebeu que estava aí a lidar com efeitos e não com causas, virando-se para uma vocação para a qual se viria a confirmar eminentemente qualificado – a de perito nas artes tradicionais Asiáticas. Apesar de ter sido investido com o fio sagrado numa cerimónia iniciática que teve lugar no Ceilão no ano de 1897, Coomaraswamy, dada a sua linhagem Oriental-Ocidental e o seu consequente estilo de vida, nunca poderia ser considerado formalmente um Hindu, e ele escreveu de si próprio perto do final da sua vida, “Eu… apenas me posso chamar de seguidor da Philosophia Perennis, ou para ser mais específico, um Vedantino.” Desta forma, ele proclamou que a sua perspectiva era a universalidade da Sanātana Dharma e o seu ponto de partida os Vedas. Apesar de obviamente não se tratar de puro Hinduísmo, era claramente o que os Céus pretendiam para que a sua mensagem chegasse ao mundo. E Coomaraswamy sempre se considerou um interlocutor Oriental, apesar de viver no Ocidente e se dirigir sobretudo a Ocidentais. Cedo na sua carreira ele referiu:

A Religião não é no Oriente, como o é no Ocidente, uma fórmula ou uma doutrina, mas sim um caminho de olhar para a vida, e inclui toda a vida, de modo que não existe a divisão do sagrado e do profano.

– um comentário, seja adicionado, que dá uma definição muito sucinta da distinção comparativa entre Tradição e Religião, tal como aprofundado no início deste ensaio.

Para Coomaraswamy, a forma correcta de olhar a arte era integral a esta posição, entendendo as artes tradicionais como reflexos de princípios imutáveis: a arte era um modo de conhecimento espiritual, quer para os artistas, quer para os patronos, de outra forma não seria merecedora da atenção do homem e, pior, seria um vício, uma vez que a falsa arte – a desgraça do individualismo – apenas pode desviar o homem dos objectivos para os quais foi criado. O conteúdo mitológico das artes que ele perseguia fascinavam e inspiravam-no – com o seu génio universal inato, similar, apesar de diferentemente orientado, ao de Guénon – a ver e revelar a fantástica homogeneidade dos padrões míticos em tradições com os mais diversos carácteres externos. Já um mestre linguista (dominando cerca de trinta línguas de várias partes do mundo), ele estava a descobrir um vocabulário comum existente num plano mais elevado e partilhado por todas as grandes religiões, nomeadamente, a linguagem do Logos ou a Palavra Primordial:

No princípio era a Palavra, e a Palavra estava com Deus, e a Palavra era Deus (João 1:1). A Pronunciação (vāk) produziu todo o Universo (Śatapatha Brāhmana VI passim). Do som dos Vedas, a Divindade suprema criou todas as coisas (Mānava-dharma-śāstra I.21).

“De todos os nomes e formas de Deus,” escreveu Coomaraswamy, “a sílaba mono gramática Om, a totalidade de todos os sons e a música das esferas cantada pelo Sol ressonante, é a melhor. A validade de um símbolo audível é exactamente a mesma de um ícone plástico, ambos servem de suporte para a contemplação (dhiyālamba); este suporte é necessário porque aquilo que é imperceptível ao olhar e ao ouvir não pode ser apreendido objectivamente da forma como é, mas apenas de através da semelhança. O símbolo deve ser naturalmente adequado, e não pode ser escolhido ao acaso.”

Por volta do início dos anos trinta, Coomaraswamy, através do Indologista Heinrich Zimmer, encontrou o trabalho de Guénon, o que trouxe definitivamente uma dimensão vertical à vasta erudição do Doutor. Pouco tempo depois apareceu um dos seus mais importantes trabalhos, The Transformation of nature in Art, o qual abordava, na realidade, a transformação da natureza do homem através das ressonâncias espirituais inerentes à arte sagrada. Apesar das nossas universidades se encontrarem repletas de teses doutorais dedicadas a primitivas, e não tão primitivas, culturas, praticamente sem excepção, estas são marcadas por um ponto de partida falso devido à ignorância das verdadeiras origens do homem e da sua íntima natureza, e isto foi o que Guénon e Coomaraswamy se propuseram a rectificar “de uma forma que podia ser ignorada mas não refutada,” como dizia o Doutor. Ele detestava a prática de ler arbitrariamente significados em coisas que já tinham o seu verdadeiro significado:

Admitamos, então, que a grande parte do que é ensinado nos Departamentos de Belas Artes das nossas Universidades, todas as psicologias da arte, todas as obscuridades da estética moderna, não são mais do que palavreado, apenas um tipo de defesa que impede a nossa compreensão da arte como um todo, em simultâneo, iconograficamente verdadeira e utilitária, compreensão que antigamente existia em qualquer mercado ou em qualquer bom artista; e, enquanto a retórica, que nada quer saber da verdade, for a regra e o método das artes intelectuais, a nossa estética não é mais do que uma falsa retórica, e uma adulação da fraqueza humana, pela qual podemos apenas ter em conta as artes que não têm outro propósito para além de agradar.

… Seja como for, temos também pretensões de ter uma disciplina “científica” e “objectiva” da “história e apreciação da arte,” na qual tomamos em consideração não só a arte contemporânea ou muito recente, mas também de toda a arte, desde o princípio até aos dias de hoje… [No entanto] Eu ponho à vossa consideração que não é, através da nossa estética, mas apenas pela sua retórica, que podemos esperar compreender e interpretar as artes de outros povos e de outras eras diferentes da nossa; eu ponho à vossa consideração, que os nossos presentes cursos universitários nesta área incorporam uma patética falácia, e que não têm absolutamente nada de científico (Figures of Speech or Figures of Thought).

Porque Coomaraswamy, tal como Guénon, estava a defender verdades intemporais mas esquecidas que não eram sua invenção, ele não hesitava em debater, com o seu formidável aparato intelectual, os ilustres académicos, com uma erudição cujo objectivo era, no entanto, puro e resoluto: que os ritos e cerimónias, as lendas e as sagas, e as artes geralmente de anteriores civilizações e que os académicos faziam sua prerrogativa elucidar, não eram mais do que diferentes expressões da linguagem do Espírito e que, qualquer tentativa para a explicar de outro modo – independentemente do brilhantismo académico – não era, no final, mais do que narcisismo académico. E se a sua mensagem caía em ouvidos moucos, Coomaraswamy afirmava, “isto deve-se à nossa geração sentimentalista, na qual o poder do intelecto foi de tal forma pervertido pelo poder da observação que não mais conseguimos distinguir a realidade do fenomenal, a Pessoa no Sol do seu corpo visível, ou do incriado da luz eléctrica, que não será persuadida ‘ainda que ressuscite alguém entre os mortos.’”

Os escritos do Doutor nos seus últimos anos tornaram-se cada vez mais centrados na Philosophia Perennis, e em particular nos seus aspectos de Caminho: “Temos que fazer o que os Deuses fizeram” era um adágio que ele reiterava a partir do Śatapatha Brāhmana: “O Sacrifício (yajña) efectuado aqui em baixo é uma imitação ritual daquilo que foi feito pelos Deuses no princípio… [Este] reflecte o Mito; mas como todas as reflexões, inverte-o. Aquilo que foi um processo de geração e divisão, torna-se agora um processo de regeneração e composição. “Tal como “no princípio,” ou in divinis; teve de existir um “Deus da morte” para “desmembrar” e, assim, libertar as possibilidades adormecidas na Substância Divina, para existir qualquer mundo ou mundos, razão pela qual tem de ocorrer a morte do Homem Externo por meio de um Sacrifício (“tornar sagrado”) que possa ser re-cordado – no sentido Platónico de recolecção (cf. Lucas 22:19; “fazei isto em lembrança de Mim”) – e restaurado ao seu Protótipo deiforme:

Esta concepção de Sacrifício como uma incessante operação e o somatório dos deveres do homem, encontra a sua consumação numa série de textos nos quais, cada uma das funções da vida activa, até ao próprio respirar, comer, beber e cortejar, são interpretados de forma sacramental, e a morte não é mais do que a katharsis final. E isso é, finalmente, o famoso “Caminho dos Trabalhos” (karma mārga) do Bhagavad Gītā, onde a vocação de cada um de nós, determinada pela nossa própria natureza, sem motivos auto-referentes, é o caminho da perfeição (Hinduism and Budhism).

Coomaraswamy via este Caminho, ou processo de “auto-anulação”, como um enredo cósmico (līlā) onde o Mito era a realidade, com a participação da passiva individualidade humana no drama reduzida a pouco mais do que um acidente histórico ou uma ilusão (“Aquilo a que chamamos a nossa “consciência” não é mais do que um processo”) – uma perspectiva que se aproximava da visão matematicamente abstracta de Guénon e que, inevitavelmente, deixava ausente toda a dimensão humana, a qual alguém teria de redimir. Um testemunho tradicional, por outras palavras, foi dado da Doutrina e do Caminho, mas uma revelação concreta do Método per se ainda estava para surgir. Se uma renovação do interesse na Tradição estava a ser alcançada, faltavam ainda as componentes essenciais para a renovação da própria Tradição.

***

Frithjof Schuon, nascido em Basileia em 1907 de descendência Alemã, tinha a vantagem e a desvantagem de surgir após os seus dois predecessores, cujas carreiras, nesse momento, já se encontravam em andamento: a vantagem, pelo facto de, pela altura em que começou a escrever, por volta dos anos trinta, Guénon e Coomaraswamy já tinham aberto imenso terreno e estavam a estabelecer um certa escola de pensamento baseada na Philosophia Perennis, nomeadamente, o núcleo dos princípios metafísicos que há muito o Ocidente tinha perdido de vista; a desvantagem, pelo facto das pessoas, até aos dias hoje, persistirem em considerá-lo um seguidor – ou mesmo um discípulo – de Guénon, quando os factos são bastante diferentes. Assim, na Introdução ao seu Logic and Transcendence, publicado em 1970, ele sentiu-se forçado a prevenir os seus leitores:

Nós não subscrevemos necessariamente todas as afirmações, conclusões ou teorias formuladas em nome da metafísica, do esoterismo, ou de princípios tradicional em geral; por outras palavras, nós não seguimos qualquer teoria pelo simples facto de pertencer a uma determinada escola, e queremos ser considerados responsáveis apenas por aquilo que por nós é escrito.

Schuon, que é aquilo que os Hindus designariam como um “mestre,” pela sua universalidade, ilude qualquer classificação simples, mas o conceito ao qual ele melhor se adapta é o da Sophia Perennis ou Religio Perennis; e a combinação de sabedoria com espiritualidade na sua mensagem faz sobressair a adequação destes dois termos, os quais podem ser sintetizados nas ideias de Teosofia e Gnose, desde que garantida a consideração destas palavras no seu sentido etimológico original e sem qualquer referência a qualquer seita, sociedade ou movimento.

Os extractos de jornais que ele guardava na sua juventude manifestam um génio espiritual instintivo, gravitando naturalmente em torno da grandeza e da beleza do Sagrado – qualidades que já se encontravam desenvolvidas antes de ele entrar em contacto com as obras de Guénon, o que acabou por acontecer com a idade de dezoito anos. Foi do Norte de África, aliás, que ele, com pouco mais de vinte anos, recebeu as suas afiliações espirituais formais.

Munido de um excepcional grau de percepção artística, combinado com uma penetrante compreensão do homem como tal, etnologicamente, culturalmente, psicologicamente e espiritualmente, Schuon tem o dom de reconstruir, a partir de um ou dois elementos, o essencial de virtualmente todas as sociedades tradicionais que alguma vez existiram – sejam os Índios Americanos, os antigos Japoneses, as tribos Africanas, ou diferentes sectores dos mundos Semitas e Arianos. O que resultou, na prática, foi um resumo e uma avaliação de correntes tradicionais, ideias e verdades espirituais, apresentadas com uma lógica e objectividade que provavelmente não teve paralelo desde um Platão ou um Śankarāchārya. A isto podemos juntar o destino de guiar e integrar almas através de uma perspectiva tradicional, crucial na sua urgência, a qual é a verdadeira antítese da perspectiva moderna, e a qual, através de uma “yoga”, combina inteligência com um total despontar das virtudes que podem conduzir para a plenitude do estado humano. Ele vê a nossa civilização moderna como uma traição para com a natureza humana – não no sentido daquilo que o homem pode alcançar, que de certa forma é praticamente ilimitado, mas no sentido daquilo para o qual o homem foi criado para alcançar. Guénon estabeleceu o padrão; Schuon completou as especificidades. Coomaraswamy apresentou o molde; Schuon completou-o com cores. Ele diz que o seu papel tem sido restaurar a noção do Absoluto, num Ocidente que caiu num total relativismo.

Os presentes desenvolvimentos do trabalho deste Mestre cai fora do âmbito do presente trabalho, mas a forma da sua Theosis é amplamente demonstrada nos seus escritos, para aqueles que os lerem. Apesar de não existir fim para aquilo que poderia ser citado, oferecemos duas passagens representativas – a primeira a partir de Light on the Ancient Worlds:

A diferença entre a visão ordinária e aquela utilizada pelo sábio ou pelo gnóstico não é claramente da ordem sensorial. O sábio vê as coisas no seu contexto total, no seu relativismo e ao mesmo tempo na sua transparência metafísica; ele não as vê como se elas fossem fisicamente diáfanas ou providas de uma sonoridade mística ou aura visível, apesar da sua visão poder por vezes ser descrita através dessas imagens… Uma visão espiritual das coisas distingue-se pela percepção concreta de correspondências universais e não através de qualquer tipo de características sensoriais especiais. O “terceiro olho” é uma faculdade que permite ver os fenómenos sub specie aeternitatis e, dessa forma, numa forma de simultaneidade; a este são normalmente acrescentadas, na natureza das coisas, intuições relacionadas com modalidades que são normalmente imperceptíveis.

O sábio vê as causas nos efeitos, e os efeitos nas causas; ele vê Deus em todas as coisas, e todas as coisas em Deus. Uma ciência que penetra as profundezas do “infinitamente grande” e do “infinitamente pequeno” no plano físico, mas que nega outros planos, apesar de serem eles que revelam a razão suficiente da natureza que vemos e providencia a chave para ela, tal ciência, é um mal maior que a ignorância pura e simples; é, na realidade uma “contra-ciência,” e os seus efeitos finais não podem deixar de ser mortíferos. Por outras palavras, a ciência moderna é um racionalismo totalitarista que elimina, quer a Revelação, quer o Intelecto e é, ao mesmo tempo, um materialismo totalitarista cego à relatividade metafísica – e, com isso, também à impermanência – da matéria e do mundo. Ela não sabe que o suprasensível, situado para além do espaço e do tempo, é o princípio concreto do mundo, e que está, consequentemente, também na origem dessa coagulação contingente e em mudança a que chamamos “matéria.” Uma ciência intitulada de “exacta” é, na realidade, uma “inteligência sem sabedoria,” tal como a filosofia pós escolástica é, inversamente, uma “sabedoria sem inteligência.”

A segunda passagem é retirada de Logic and Transcendence:

A vida humana é adornada com incertezas; o homem perde-se no que é incerto em vez de se agarrar àquilo que é absolutamente certo no seu destino, nomeadamente a morte, o Julgamento e a Eternidade. Mas para além destes existe uma quarta certeza, imediatamente acessível à experiência humana, e esta é o presente momento, no qual o homem é livre de escolher entre o Real e o ilusório e, assim, descobrir por ele próprio o valor das três grandes certezas escatológicas. A consciência do sábio está fundada sobre estes três pontos de referência, quer directamente, quer de uma forma indirecta e implícita através da “lembrança de Deus”… A coisa importante a compreender aqui é a actualização da consciência do Absoluto, nomeadamente, da “lembrança de Deus” ou “oração”… é já uma morte e um encontro com Deus e coloca-nos já na Eternidade; é já algo do Paraíso e mesmo, na sua misteriosa e “incriada” quintessência, algo de Deus. A oração quintessencial provoca um escape do mundo e da nossa vida e, dessa forma, confere um novo e Divino enfraquecimento do véu das aparências e da corrente das formas, e um fresco significado à nossa presença por entre o enredo dos fenómenos.

Aquilo que não existe aqui não existe em parte alguma, e tudo aquilo que não é agora nunca o será. Neste momento, em que eu sou livre de escolher Deus, também será morte, Julgamento e Eternidade. Da mesma forma, neste centro, neste ponto Divino em que sou livre de escolher na face deste ilimitado e múltiplo mundo, eu já estou na Realidade invisível.

Adoptando uma perspectiva geral, o que podemos dizer sobre quais foram as repercussões no mundo resultantes do trabalho dos três autores em discussão? Sem dúvida que as suas ideias são agora conhecidas e estudadas de uma forma séria no meio académico e nos círculos intelectuais da América ao Japão; as suas obras traduzidas em várias línguas. Desde há muitos anos que a publicação periódica, Études Traditionnelles, tem sido um instrumento para estas ideias em França, e existe a mais recente publicação Inglesa, Studies in Comparative Religion.

Em relação a eventos inspirados directamente por este trabalho, o primeiro foi a realização de um colóquio inter-religioso em Houston, Texas, em 1973 sobre o tema “Modos Tradicionais de Contemplação e Acção,” o qual, é importante salientar, nada tem a haver com o ecumenismo como actualmente entendido – este último um humanismo disfarçado de espiritualismo, corrosivo para a verdadeira espiritualidade – mas sim com um conjunto de forças religiosas unidas na causa comum de resposta aos danos do ateísmo. Posteriormente, em 1976, realizou se um Festival do Mundo Islâmico em Londres, e em 1985, uma conferência sobre a Tradição foi organizada pelo Instituto de Estudos Tradicionais em Lima, Peru.

Em 1974, uma Academia Imperial Iraniana de Filosofia, devota ao estudo da filosofia tal como entendida pela Tradição, foi fundada em Teerão sob a direcção de Seyyed Hossein Nasr, mas em 1980, os distúrbios políticos no Irão levaram ao encerramento da mesma, incluindo a sua publicação periódica, Sophia Perennis. Em 1979, um Instituto do Sri Lanka de Estudos Tradicionais foi inaugurado em Colombo e, mais recentemente, uma Fundação para Estudos Tradicionais foi criada em Washington, nos Estados Unidos da América.

Mas esta perspectiva geral apenas diz respeito à renovação do interesse na Tradição, o que é uma coisa, enquanto que a prática da Tradição é outra. Nestes tempos de degeneração, que produziram inúmeras pseudo-religiões, muitas vezes com raízes Orientais, o Adversário usa múltiplos disfarces, e parece ser quase impossível encontrar alguém que consiga distinguir o golfo que separa os ensinamentos autênticos das distorções que deles fazem pessoas como a Madame Blavastky, Krishnamurti, Aurobindo, Gurdjieff e outros – e isto apesar de Guénon, Coomaraswamy e Schuon terem incansavelmente fornecido as chaves necessárias para tal discernimento. Mas Deus conhece os seus, e não é uma questão de números, mas estritamente uma de dimensão qualitativa no seio deste Reino da Quantidade, tal como Guénon caracteriza o momento cósmico que estamos a passar neste momento.

O assunto pertinente para o leitor deste livro não é o do tipo macrocósmico da possibilidade ou impossibilidade de uma restauração tradicional – algo que apenas a intervenção do Céu pode alcançar – mas sim um microcósmico, nomeadamente, a certeza que algo, com base neste conhecimento, pode e deve ser feito em cada alma individual, enquanto ainda neste planeta, e antes daquele momento em que é lançada para o Oceano Cósmico, onde apenas as considerações tradicionais têm qualquer relevância – quando o véu ilusório de um auto-suficiente materialismo é removido e ficamos despidos perante os benéficos ou terríveis modos da Realidade.

Uma pessoa que tenha descoberto verdadeiramente as suas fundações tradicionais ficará para sempre em paz consigo próprio e o seu universo, sabendo, usando as palavras de Guénon, “que “o fim de um mundo” nunca é e nunca pode ser nada mais do que o fim de uma ilusão.”

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